(Originalmente publicado no T&Q. Agora revisto e ampliado)
Minha geração bebe. E bebe muito. Bebe até cair. Bebe pra esquecer, pra fugir, pra se esconder, pra desabafar, pra chorar e pra sorrir. Detesta o gosto amargo da cerveja, mas bebe assim mesmo. Não se importa com a data de vencimento do vinho barato que comprou na loja de conveniência do posto de gasolina, e não faz diferença quem paga a conta. Afinal, minha geração paga as contas com o dinheiro dos pais, e quem se importa depois, desde que não apareça em casa com a camisa manchada de vômito ou os olhos vermelhos?
Sim, minha geração usa drogas. Todas elas, de todas as formas e, muitas vezes, de uma vez só. E não parece se importar, porque sabe que no final é ela quem vai limpar tudo mesmo. Fumam, tragam, cheiram, se picam, acenam para o infinito como se aquele momento fosse o último de sua curta e inóspita existência surreal. E depois grita. Grita para não chorar. Grita para ser ouvida. Grita por socorro. Grita por perdão. Grita por misericórdia, por um pouco de comiseração, talvez um pouco mais de compreensão ou um gole a mais de cerveja long neck quente.
Minha geração nunca pegou uma gonorréia de leve num puteiro de beira de estrada. Não sabe o que é sentir o calor de uma mulher sem pensar no que isso pode acarretar para o seu futuro ainda cheio de incertezas. Querem o sexo como um sedento num deserto sem direito a um copo d´água decente. Transam sem camisinha para depois serem censurados por aqueles que inventaram a porcaria toda. Broxam aos 21, têm ejaculação precoce aos 25 e procuram nas páginas de revistas especializadas um pouco de luxúria artificial para suas vidas. Mentem para si mesmo e acreditam nisso.
Nunca sentiram o vento nos cabelos pilotando uma moto, porque a lei não permite que andem sem capacete. Vivem suas prisões como se fossem confortáveis e inevitáveis residências.
Minha geração gosta de música. Gosta de jaquetas de couros, calças rasgadas, toucas de lã, camisas de flanela, tênis de fibra de cânhamo e piercings nas cartilagens. Pensa que quatro garotos norte-americanos de cabelos espetados e pele bem tratada são punks, mas têm pôsteres de quatro garotos norte-americanos vestindo jaquetas de couro e calças jeans rasgadas colados na parede do quarto. Minha geração tem bandas que jamais farão sucesso além do quarteirão onde moram, pois precisam acordar cedo na manhã seguinte para aprender que o país onde moram foi descoberto e dominado por estrangeiros e permanece assim até hoje. Aprendem que é inútil resistir, que seus sonhos são “coisa de moleque” e sumirão logo que descobrirem que são pequenos demais, roucos demais, fracos demais e bonitos demais para conseguirem o que querem.
Minha geração é humilhada constantemente por sua própria incoerência, não vê saída senão a sarjeta onde o mundo deposita seu lixo. Minha geração se sente pior que lixo. É repleta de dúvidas, e elas não são solucionadas por velhos livros que ninguém mais lê, mas que assim mesmo permanecem na prateleira para lembrarem o quanto existe gente melhor e mais bem sucedida que um punhado de garotos com a cara purulenta e olhos faiscantes. Ouve histórias fantásticas de gerações anteriores e não encontra eco na sua, não possuem argumentos para barrar o caudaloso rio de lava de informações que frita seus cérebros e faz pavê de seus anseios.
Minha geração vomita quando leva um fora, ainda não aprendeu a lidar com seus impulsos mais primitivos e é taxada de auto-destrutiva e perdida, abobalhada, sonsa e incapaz, e ajuda psicólogos a venderem livros de auto-ajuda. É filha de gente que não sabe como ter filho, que venderam suas almas e esperam que as vozes em constante mutação paguem o preço.
Claro, minha geração não pertence a esse mundo. Ouve dizer que há lugares onde os dias são puro fastio e as noites, pura festa. Quer viver em um rave interminável, dopada, aloprada, livre de qualquer responsabilidade, porque minha geração é irresponsável, não consegue sequer lavar o carro do pai direito para poder ter direito a uma volta na avenida principal da cidade. E conta para os amigos que nada que faz dá certo e eles acenam positivamente com as cabeças cobertas de cabelos desgrenhados ou empastados de gel. E ouvem que se não cortarem a barba e não pararem de usar camiseta com estampa de disco de banda norte-americana não conseguirão empregos, e não terão dinheiro para nada, e não serão nada e então não servirão para nada e serão pegos pela carrocinha e transformados em sabão, pois morarão pelo resto da vida com os pais.
Então bebem. E choram. E são carregados. E vomitam. E dormem. E sonham. Sonham até se cansarem. Então acordam. E amaldiçoam o tempo que nasceram.
Minha geração é igual a todas as outras.
I'm Winston Wolfe. I solve problems.
segunda-feira, julho 18, 2005
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3 comentários:
é verdade!
quem sabe haja esperança???????
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