I'm Winston Wolfe. I solve problems.

sábado, abril 28, 2007

Se enquadra, rapá!


    Um dos melhores shows de rock que assisti até hoje aconteceu na praça de eventos do Tivoli Shopping, em 1999. Num palco improvisado, Lobão e três violões mostraram que é preciso muito pouco para fazer música de verdade. No final do set, empolgado pela platéia que o cercava e pedia bis, fechou ao seu estilo gritando, entre outros impropérios, que “A MTV é uma merda”. Na última semana, Lobão lançou seu novo disco. Um acústico. Um Acústico MTV. E isso, crianças, é uma dura e valiosa lição a ser aprendida.


    Lobão foi sem dúvida um dos artistas mais importantes de sua geração. Daquele caldo ocre oitentista, ele foi o único que não olhou pra trás e buscou se posicionar de maneira coerente, mantendo firme suas posições musicais e políticas. E pagou caro por isso. Para fazer o que bem entendia, inventou de vender disco em banca de jornal e lançou três belas e pouco ouvidas bolachas. Sempre vociferando contra as grandes gravadoras, posando de paladino dos independentes, fera incapaz de ser domada. De 1999, data de sua estréia “oficial” no mercado fonográfico underground, até a última semana, Lobão era o último dos grandes heróis do rock brasileiro. Agora, bom, já não resta nenhum.

    Ao contrário do que diz um antigo amigo de Lobão, nossos heróis não morreram de overdose. Eles venderam sua dignidade por discos de ouro e playbacks em programas de auditório. E o que mais dói no caso do velho lobo é que ele não pode ser acusado de “trair o movimento” porque jamais fez parte de um. Lutou sozinho o tempo todo, o que lhe dava crédito extra é bom ressaltar. Pior é lê-lo dando declarações estapafúrdias do tipo "o negócio melhorou" e "agora a coisa é diferente" para explicar porque aceitou fazer o programa. Melhorou o que? Diferente em que?

    É só relembrar as verborrágicas e inglórias lutas de Lobão para saber que o músico não obteve sucesso em nada do que propôs de fato. Numeração de CDs para que o artista soubesse de fato o quanto vendeu? Jamais saiu do papel. Denúncia de pagamento de jabá para as rádios pelas gravadoras? Se a prática não aumentou, também não diminuiu. Se alguma de suas batalhas tivesse vingado ele poderia, sim, discursar que voltou para o mainstream porque agora se faz merecedor de um sujeito como ele. Mas isso não aconteceu. Então alguém pode me dizer o que leva Lobão a falar bobagens tão grandes quanto essas?

    A resposta está no próprio cenário do teatro onde ele gravou seu Acústico MTV. O fundo é composto por grossas molduras de quadros. Mais metafórico e ao mesmo tempo didático impossível. Lobão foi enquadrado. Ou melhor, se deixou enquadrar pelo sistema que tanto criticou. E fez por dinheiro? Fama? Vontade de se ouvir nas FMs populares?

    Não, crianças. Fez porque finalmente entendeu que a recompensa dos verdadeiros revolucionários, transgressores e rebeldes é o reconhecimento póstumo. E se ele quer se fazer ouvir agora, se quer que sua música chegue aos ouvidos dos 90% que não são ligados no mundinho dele, é preciso ceder. É preciso crescer e entender que as coisas não são exatamente como a gente quer.

    Além de talento, é preciso inteligência pra fazer os frutos desse talento ser apreciados em seu devido tempo, e não quando já estiverem podres. A realidade, a vida, ao contrário do que prega seu primeiro disco independente, é mais amarga do que se imagina. E até um lobo precisa vestir sua pelinha de cordeiro de vez em quando se quiser sobreviver. Não há nada de errado nisso. Mas é preciso muito culhão para admitir o próprio fracasso.

      6 comentários:

      Fábio Shiraga disse...

      Do caralho o texto e as observações feitas, meu caro.
      Eu ainda não ouvi o disco, mas o que posso dizer sobre isso é que o Lobão é um cara de retórica e que gosta de ser polêmico. O Lobo Bobo como cantava Caetano, não tem nada de bobo. Nem acredito que a frase do baiano fosse para ele, mas ele tomou como sendo, e eu digo que continuo achando graça no rock & roll circus. Polemizar continua sendo interessante para Lobão, ou será que ele não imginava que choveriam críticas quando resolveu fazer este Acústico?

      Eu também vi este show que você viu em 99. Não no Tivoli, mas em um shopping em São Bernardo. Era o mesmo esquema em três ou quatro shoppings do estado. Vi Cássia Eller e Beto Guedes também, no mesmo esquema. Era bom...

      Abraço.

      Biajoni disse...

      não me incomodo com essas mudanças de opiniões ou "voltas atrás"... não achei nada de errado quando o ultraje também gravou acústico. nem com a volta dos mutantes sem a rita.
      :>)

      B! disse...

      Pode não ter sido um 'absurdo' o fato d'ele ter se 'vendido ao sistema'... mas que foi um belíssimo caso de hipocrisia, ah foi...

      Brigateando disse...

      Metade da importância de Lobão vinha do fato dele ser língua-solta e manter suas posições. Depois dessa, sobrou muito pouco para admirar o cara.

      Anônimo disse...

      É... os heróis também precisam levar pra casa o leitinho das crianças...

      Anônimo disse...

      é o que dá as vezes perder a chance de ficar quieto...
      muito bom texto!