Sexo exige trilha sonora? Melhor: existe trilha sonora para sexo? Não estou dizendo chavões óbvios que todo mundo gosta de citar apenas para parecer interado na coisa, tipo "Je T´aime" do Gainsbourg ou o Joe Cocker de "9 1/2 Semanas de Amor". Na boa, não conheço ninguém que goste, sinceramente, de uma dessas baladas de puteiro decadente (e existe um puteiro que não seja decadente?) na hora que a coisa esquenta. Na verdade, a maioria das pessoas é como uma antiga colega de redação, que afirmava não ouvir nada durante o sexo porque estava concentrada demais para prestar atenção em qualquer outra coisa.
De fato, alguns podem dizer que a sacada mesmo é o "som ambiente", de gemidos, gritos, palavras de ordem, obscenidades, tabefes e o ruído abafado e seco das estocadas. De fato tal soundtrack não pode faltar - na verdade, ele é parte indissociável da coisa toda, como as antigas trilhas de novelas feitas sob encomenda para grandes artistas.
A grande sacada é que nem sempre o que gostamos ou admiramos acaba no toca-discos quando as roupas começam a fazer parte da decoração do recinto. Eu mesmo tenho um grande amigo, punk das antigas, daqueles que só ouvem de bandas undergrounds inglesas pra baixo. Num belo dia, tomando umas na casa do sujeito, encontro o "The Dark Side of The Moon" entre um Stooges e um GBH. "Sabe como é, a D. só goza ouvindo Pink Floyd, então...", tenta se explicar, deixando claro que tal heresia é por uma boa causa. Só posso concordar. O sexo justifica tudo e mais um pouco. Até ombrear Joe Ramone com Roger Waters (!).
Eu mesmo não dispenso um bom fundo sonoro. E como estamos falando de sexo de verdade, feio, sujo, malvado e feito com todos os seis sentidos, é inevitável apelar para a música negra. No meu caso, o hip hop feito nos EUA nesse começo de século. Que me perdoem os mestres do hard rock 60/70 que formam minha base/gosto musical, mas não consigo me imaginar pelado & melado com o Robert Plant cantarolando agudos no meu ouvido. Ou o Paul falando da cachorrinha dele. Sem essa, bróda.
Pode falar o que quiser. A discussão aqui é da cintura pra baixo e, sejamos francos, branco não consegue fazer música pra isso. O máximo que chegam perto é um Elvis ou um Mick Jagger, mas nem se compara com a sensualidade que escorre de legítimas batidas cadenciadas comandas por quem entende da coisa. É só ouvir algum monstro sagrado do jazz, qualquer um deles, para sacar que o que eles dedilham, assopram ou batucam tem um único e certeiro alvo: a pélvis do ouvinte. É lá que mora o sentido da coisa toda. Duendes, anjos e demônios, cidades na Lua, crônica social e política, é coisa de cabeludo branquelo doido de cogumelo, baby, então cala a boca que o que interessa sou eu, você e nossas bocas quentes coladas e cheirando a bebida numa cidade qualquer do mundo.
O único branco que talvez surta o mesmo efeito sobre minha psique sexual seja Jim Morrison. O líder dos Doors não canta, ele sussurra feito um demônio tentando te convencer a entrar num bacanal eterno, cercado de promessas de delícias inimagináveis e perigosas. Basta ouvir a mais emblemática delas, "L.A. Woman", onde Morrison detona, aos berros, que "Mr. Mojo Rising" (o Sr. Mojo está subindo, numa tradução livre) - mojo é uma gíria para libido ou órgão sexual, e a frase completa, diz a lenda, é um anagrama de Jim Morrison. A levada da canção é ótima para neófitos na arte, um crescendo quase didático que imprime ritmo e velocidade na medida até desenbocar num êxtase luxurioso e voltar à placidez inicial. Dá vontade de acender um cigarro, cruzar os braços atrás da cabeça e curtir a energia se esvaindo pelos póros.
Mas eu ainda prefiro o hip hop de atualmente, feito por energúmenos do tipo 50 Cent, Bustha Rhymes, Redman, Lil´ Kim, Timbaland e afins porque falam direto o que quero ouvir - e só na hora que quero ouvir. A batida que encaixa com perfeição no baixo e resvala caudalosa por um arranjo sintético que te faz chacoalhar o quadril - outra vez e sempre ele - involuntária e cegamente é um poderoso concentrado de sexualidade feito para ser ingerido dissolvido em suor - e outros líquidos pelos mais avançadinhos. Não é preciso se preocupar com o que eles falam porque está implícito. É sacanagem, irmãzinho, e isso basta. Porque é disso que se precisa, right here, right now.