I'm Winston Wolfe. I solve problems.

quinta-feira, dezembro 06, 2007

Na toca o ogro / Minha primeira Neosaldina em POA



    "Let's get it started
    let's get it started in here"

    Let's Get It Started - Black Eyed Peas

    O convite veio com o seguinte aviso:

    "O boteco é 'fechado', então batam na porta - vão olhar estranho, digam que vão tomar uma ceva com o tiago casagrande e fica beleza. pra quem não conhece, é uma adega de cerveja, self-service - e só $ ou cheque :D "

    Então vamos elencar o que eu NÃO SABIA até aquele momento:

    - O que diabos é um boteco "fechado", que só te deixam entrar se você tiver uma senha?

    - Quem é Tiago Casagrande? E por que ele era a tal senha?

    - Que porra é uma adega de cerveja self-service? Bandejão vá lá, mas adega?

    - Não aceita Visa nem Mastercard?

    Aquilo não estava certo. Tinha conhecido o tal Tiago Casagrande através do Bia - o mesmo que me apresentou o conhaque Macieira (e um posterior vício), ao Vic Chesnutt e uma ou outra cosita ilegal. Quer dizer, bela referência, não? Mas Tiago Casagrande na verdade era o alter-ego de Tiagón, ou El Rey, como é conhecido em Petrópolis - não a cidade carioca que fabrica a cerveja estranha que o Bia aprendeu a gostar por motivo de força maior, mas o bairro porto alegrense onde coisas estranhas acontecem com cervejas. Tiagón também é dono do Verbeat, um desses condomínios de luxo para intelectuais da terceira idade - ops, melhor idade, desculpem o politicamente incorreto.

    Mas eu iria. Claro que iria. Para onde mais eu poderia ir? Sete horas em ponto Tiagón estava lá, enquanto eu chamava um taxi - agora só ando de táxi, igual a vocês-sabem-quem-porra! Entro no carro e o motorista: "Para onde vamos?". Eu: "Rua João Abótti esquina com Carazinho". Ele: "Ah, João Ábott com Carazinho. Tu é paulista, é?". Era só a primeira da noite que mal começava. E ao contrádio do que dizia o Gessinger, o anoitecer em Porto Alegre é mineiro. Hum, essa ficou boa.

    Eu vou de preto. Eu só visto preto. Porque não sou moleque nem convencional, oras. E calço coturnos recém-engraxados. E algumas notas cor-de-rosa na carteira. A carteira também é preta. "Verde, amarelo, vermelho, espelho retrovisor...", tô mentindo, Berto? Mas o bar é azul. Não tem placas, não tem luminosos, sequer um neónzinho indicativo. Na verdade, só falta uma placa dizendo "Cuidado, cão anti-social". Bato na porta e percebo que não falta nada. A rótula abre e um sujeito parrudo, careca, de olhos vidrados e bochechas inexpressivas, surge. Sou automaticamente transportado para uma das inúmeras partidas de Dangeons & Dragons de minha adolescência, onde toda história sempre envolvia uma taverna - ou taberna - e um ogro. Quer dizer, eu era o Hank e estava pronto para envergar meu arco de luz, dar fim àquela criatura e conseguir algum XP quando optei pela diplomacia. "Oi... hã... vim tomar uma... tomar uma com o... hã... Tiago Casagrande".

    Ele não pisca. Fecha a portinhola de vidro, abre a porta maior e faz sinal para eu entrar. Guardo meu arco e piso com minhas botas bucaneiras de cortiça. "Pode entrar, eu te encaminho", indica, solícito, o ogro branco de grandes olhos esmeralda. Sigo por um corredor tortuoso até uma sala com dois ambientes. O teto coberto de capas de discos de vinil. Duas mesas ocupadas. Numa delas, um grupo de louras semi-nuas e desbocadas, entornando lascivamente long necks de cerveja uruguaia, besuntava uma a outra com óleo de bronzear. Uma delas usava uma tiara dourada, botas brancas, tomara-que-caia dourado e acariciava um cavalo alado. Na outra mesa, dois sujeitos com cara de publicitários fodidos e mal pagos empilhavam garrafas de vários rótulos.

    "Senhor, eu não sou digno de que entreis em minha morada, mas faça o tal Tiagón ser uma daquelas gatas, e eu serei salvo", rezei, entredentes. O ogro me encara, percebe que não faço idéia de quem vim procurar. Ele fareja uma mentira e está pronto para me bicudar para fora da taverna - ou taberna - quando o próprio El Rey se apresenta. Claro que não era uma garota. "Ei, eu esperava um careca!", é a primeira coisa que ele diz. Rebato com uma piadinha sobre ter esterco na cabeça e tal. Na mesa está o inacreditável Alexandre Alaniz - AA para os integrantes do seu grupo de apoio homônimo - e a bela... a bela... ah... ah, sim, Márcia Prado. Segundo a lenda, Márcia é a feliz proprietária de um grupo de amigas mais seletas que a laranja da feijoada do Chico. AA que o diga. Eu não vou dizer nada a esse respeito por amor aos meu bagos, entendam.

    Feitas as devidas apresentações, precisava de um copo, porque ao contrário das garotas da mesa ao lado, não estava, assim, digamos, tão inspirado a dar beijo de língua em garrafa. "Pega lá", chapiscou Tiagón. "Lá na cristaleira da entrada. Vai lá e pega um copo". Então entendi o significado de uma adega de cerveja self-service. Fui lá e saquei uma tulipa profissional pintada com um rótulo de Itaipava - eu acho... Daí por diante o que se seguiu foi basicamente um toma-lá-da-cá de impropérios, vitupérios, causos ternos, tiradas ácidas, palavrões, gargalhadas homéricas e galhofas pândegas das mais diversas embalando o eterno clássico paulistas X gaúchos.

    Isso até às 22h. Porque às dez EM PONTO a taberna - ou taverna - fecha. O ogro proprietário toca os incautos. "Vou fechar. Saideira", anuncia. Ninguém é louco de questionar. Tiagón ainda tenta passar uma lábia no calvo. Mas ele está nos seus domínios. Saímos. Ainda com sede. Ah, sim, o boteco é imperdível. E só entra quem conhece alguém conhecido do proprietário. Mais um segredo revelado. Estariam as coisas entrando nos eixos? Ao longe, o Laçador observava, passivo, o cair da noite. Havia sede, era fato. E Tiagón e AA, para usar uma expressão típica de um capiau paulista, pareciam ligados no 220V. Dupla de ataque, linha de frente, vocal e guitarra, queijo com goiabada, Lennon e McCartney, complentando frases, trocando insultos, rememorando piadas internas, interrelacionando conspirações, a noite começava a girar e eu queria sair cavalgando a noite no cavalo alado daquela garota de botas brancas e tiara dourada.

    Ainda deu tempo de uma nova saideira no Show do Íche, agora acompanhados de sereno e contrastante casal. Hora de ir embora. AA me confidencia que gosta de videogame e tem um Play Station 2 em casa. Meus olhos marejam. Faço um talho no dedo e proponho um pacto. Meu taxi chega.

4 comentários:

Fábio Shiraga disse...

Great text. Amusing and dark story. I liked it! Keep on writing, mate!

Anônimo disse...

MASSA :D

-- tiagón

Anônimo disse...

Na primeira saidinha e já tá fantasiando de novo! Garota com tiara dourada e bota branca? Não era vc que odiava a Xuxa e as paquitas? E, pelo que entendi do lugar, era mais fácil encontrar o Shrek, a Fiona e o Burro do que belas garotas alisando cavalos alados. Quanto ao comentário sobre a bela seja lá quem for, melhor vc se controlar. Respeito é bom e eu ainda gosto. Espero que vc também ainda goste dos seus bagos.
Quanto aos meninos, agradeça a eles por mim por te tirarem de casa e te levarem pra respirar. Vc estava precisando.
Bjs

Biajoni disse...

90 % desse texto é mentira.