I'm Winston Wolfe. I solve problems.

quarta-feira, agosto 29, 2007

Assim, assim

Queria que a vida fosse uma canção pop perfeita. Britânica, de preferência. Mas o máximo que conseguiu foi uma passagem para o mais longe que pudesse chegar. E os lábios ressecados toda manhã durante o inverno lembravam das escolhas que não havia feito, dos caminhos partilhados por profunda e incerta necessidade de proteção e, principalmente, daquelas coisinhas que tanto a incomodavam toda vez que respirava um pouco mais forte. Sentia o amor que tanto cultivava por si espremer por entre os dedos dos pés, com se pisasse no lodaçal da própria inconstância. Sentia a vibração do vento passando pelas frestas das janelas daquela cidade tão desajeitada e abraçava o primeiro poste que encontrava pela rua, as canelas nuas e as unhas dos dedos das mãos roídas. Roídas de tristeza. Roídas de solidão. Roídas de prazeres secretos. Roídas de desejo de aprender a tocar violão só para mostrar que de fato qualquer um podia fazer poesia com meia-dúzia de fios de metal. Nunca antes atravessara o escasso matagal que separa o desejo da inconsciência, a razão de um pote de sorvete, o duvidoso do errado. Escolhia pela capa, pelo cheiro, pela cor dos cabelos, o corte do jeans e até de olhos fechados. Entre os cantos da boca, formara pequenas e duras cavidades de tanto sugar a vida logo onde nascia, e sentia o coração apertar nos primeiros goles da amarga bebida conhecida nos tantos cantos escuros que aprendera a reconhecer de sonhos e delírios nada significativos perante a grandeza e insuficiência daquilo ao redor. Os erros de ortografia nas cartas eram sinceros e propositais, feitos para mostrar o quanto não se importava, seu ego auto-inflável, sua arrogância pueril, a petulância típica dos que ainda apresentam o lombo liso de cordas e as orelhas furadas em mais de um lugar. Foi de encontro ao que sempre relutou, arrancou tudo o que podia com os dentes e assegurou-se que o tédio que cuspira para cima jamais cairia sobre seus olhos. Fez então um rabo-de-cavalo, correu e acenou para o primeiro ônibus que virou na esquina. Foi.

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