Se eu tivesse que responder, num questionário qualquer, o que aprendi nestes cinco anos de jornalismo - cinco anos enfiado dentro de uma redação de jornal de interior - eu responderia como o Mr. Wolfe, personagem de Harvey Keitel em "Pulp Fiction", quando chega até a casa onde está um cadáver para ser desovado: eu resolvo problemas. É isso. Sou especialista em resolver problemas. Porque se tem uma coisa que sai pelo ladrão no tipo de lugar onde aprendi a trabalhar, é problema.
Passo a maior parte do meu tempo resolvendo problemas. Meus e das outras pessoas. E acabei me convencendo que sou realmente bom nisso. Tanto que fui promovido a editor com meros 2 anos de casa e 1 e meio de formação. Entendam que, num jornal como o que trabalho, o trabalho de um editor é medido pela capacidade dele de resolver... problemas. Não porque é de fato excepcional na área onde vai atuar ou coisa do tipo. Isso ajuda, mas não é o principal. O que conta mesmo é sua habilidade em fatiar pepinos, descascar abacaxis, enfim.
Talvez por isso, nunca vá trabalhar numa Folha de S. Paulo, por exemplo. Ou seja contratado pela Rolling Stone. Não tenho a inclinação (afetação?) necessária para ser o sujeito que precisam. Nunca fui para fora do País, meu inglês é macarrônico, não gasto mais do que 15 minutos do meu dia tentando descobrir a origem do som da última bandinha do norte da Escócia estampada na capa de algum grande caderno de cultura, não tenho um I-Pod e sou heterossexual por opção.
Mas sou capaz de virar um jornal inteiro nas costas. Da portaria à entrega, nada me é estranho. Houve um tempo que via demérito e até com ingratidão essa estranha sina. Para o bem ou para o mau, me formei na escola da vida. E os professores que lecionam nela não costumam amaciar. Por isso, é natural o aluno, quando se forma, apresentar calosidades nos lugares mais insuspeitos. O resultado é este diálogo, que tive hoje com uma repórter.
- Querida, vem cá. Vamos conversar. Você gosta de escrever?
- Ah, gosto.
- Então porque não aprende?
- Ai, tava ruim a minha matéria?
- Puta que pariu! Ruim? Tive que reescrever ela inteira! Na verdade, nem deveria publicar. Mas não sou louco de derrubar trinta centímetros de texto numa sexta-feira. Aí eu ia me fodê, né?
- Mas o que tinha de tão errado?
- Tudo, bicho! Apuração, contextualização, fontes... até conjugação de verbo tava errada! Ah, tenha dó, filha!
- Ai, mas eu tinha 9 pautas hoje, não tinha como fazer melhor. E outra, não tem telefone pra todo mundo, eu precisei esperar meia hora pra poder ligar para o...
- Ah, não, não vem com essa. O que o telefone tem a ver com a sua incapacidade de combinar sujeito e verbo?
- É que tem muita coisa, e aí eu preciso escrever rápido, porque...
- Filhona, acorda! Escrever rápido é item de série. Não é mérito algum. É obrigação, esqueceu que o jornal é diário? O problema não é tempo, é você. Tá no lugar errado. Vai ser assessora de órgão público, sei lá.
- Tá bom, então. É o que você acha? Tá bom, então.
E saiu chorando pelo corredor. Aí fiquei naquela sala ridiculamente gelada e iluminada pensando que se tivesse acertado um soco no nariz dela, doeria menos. Mas não tem como saber do que as pessoas são feitas até chegarmos bem perto e experimentarmos. E então acabo me comportando como um tubarão branco, que morde para saber se aquela coisa boiando na superfície é um tronco ou uma foca. O problema é que depois da mordida, seja um tronco ou uma foca, sobra pouca coisa. Mas esse é só mais um problema...
Passo a maior parte do meu tempo resolvendo problemas. Meus e das outras pessoas. E acabei me convencendo que sou realmente bom nisso. Tanto que fui promovido a editor com meros 2 anos de casa e 1 e meio de formação. Entendam que, num jornal como o que trabalho, o trabalho de um editor é medido pela capacidade dele de resolver... problemas. Não porque é de fato excepcional na área onde vai atuar ou coisa do tipo. Isso ajuda, mas não é o principal. O que conta mesmo é sua habilidade em fatiar pepinos, descascar abacaxis, enfim.
Talvez por isso, nunca vá trabalhar numa Folha de S. Paulo, por exemplo. Ou seja contratado pela Rolling Stone. Não tenho a inclinação (afetação?) necessária para ser o sujeito que precisam. Nunca fui para fora do País, meu inglês é macarrônico, não gasto mais do que 15 minutos do meu dia tentando descobrir a origem do som da última bandinha do norte da Escócia estampada na capa de algum grande caderno de cultura, não tenho um I-Pod e sou heterossexual por opção.
Mas sou capaz de virar um jornal inteiro nas costas. Da portaria à entrega, nada me é estranho. Houve um tempo que via demérito e até com ingratidão essa estranha sina. Para o bem ou para o mau, me formei na escola da vida. E os professores que lecionam nela não costumam amaciar. Por isso, é natural o aluno, quando se forma, apresentar calosidades nos lugares mais insuspeitos. O resultado é este diálogo, que tive hoje com uma repórter.
- Querida, vem cá. Vamos conversar. Você gosta de escrever?
- Ah, gosto.
- Então porque não aprende?
- Ai, tava ruim a minha matéria?
- Puta que pariu! Ruim? Tive que reescrever ela inteira! Na verdade, nem deveria publicar. Mas não sou louco de derrubar trinta centímetros de texto numa sexta-feira. Aí eu ia me fodê, né?
- Mas o que tinha de tão errado?
- Tudo, bicho! Apuração, contextualização, fontes... até conjugação de verbo tava errada! Ah, tenha dó, filha!
- Ai, mas eu tinha 9 pautas hoje, não tinha como fazer melhor. E outra, não tem telefone pra todo mundo, eu precisei esperar meia hora pra poder ligar para o...
- Ah, não, não vem com essa. O que o telefone tem a ver com a sua incapacidade de combinar sujeito e verbo?
- É que tem muita coisa, e aí eu preciso escrever rápido, porque...
- Filhona, acorda! Escrever rápido é item de série. Não é mérito algum. É obrigação, esqueceu que o jornal é diário? O problema não é tempo, é você. Tá no lugar errado. Vai ser assessora de órgão público, sei lá.
- Tá bom, então. É o que você acha? Tá bom, então.
E saiu chorando pelo corredor. Aí fiquei naquela sala ridiculamente gelada e iluminada pensando que se tivesse acertado um soco no nariz dela, doeria menos. Mas não tem como saber do que as pessoas são feitas até chegarmos bem perto e experimentarmos. E então acabo me comportando como um tubarão branco, que morde para saber se aquela coisa boiando na superfície é um tronco ou uma foca. O problema é que depois da mordida, seja um tronco ou uma foca, sobra pouca coisa. Mas esse é só mais um problema...
7 comentários:
Ai ai ai, Gustavo...
Pobrezinha. Ouvi uma história parecida recentemente por aqui. Também senti pena. Mas é que eu sou um cara bonzinho demais.
Abraço.
Shira, nice Guys don´t play rock´n´roll, já dizia aquele vocalista da antiga melhor banda do final dos anos 80...
Cara, vc me assusta...
O loko bixo, pegou pesado heim ... hauauhauahauaha
Tá quase no ponto para entrar no BOPE
Seguinte: é que você ainda é "novinho". Quando ficar véio que nem eu, não vai perder nem 15 minutos tentando saber qual é a da última bandinha do norte da Escócia (ou do sul da Islândia). Se eles da tal banda quiserem, eles que venham na tua casa. Mas avisem com bastante antecedência, pra você pensar se vale a pena perder esse tempo ou outro tempo qualquer.
Seguinte: é que você ainda é "novinho". Quando ficar véio que nem eu, não vai perder nem 15 minutos tentando saber qual é a da última bandinha do norte da Escócia (ou do sul da Islândia). Se eles da tal banda quiserem, eles que venham na tua casa. Mas avisem com bastante antecedência, pra você pensar se vale a pena perder esse tempo ou outro tempo qualquer.
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