Em 1997 eu não perdia uma domingueira do Rio Branco. Numa época pré-Internet, o rádio e os bailes animados pelo Som do Erik eram nossa única fonte de informação a respeito de música - sacaram o drama? É, não era nada fácil ser adolescente naquela época. O pior era, no auge da ebulição hormonal que caracteriza essa fase, acabar resvalando no inevitável pedantismo típico de quem quer mostrar um conhecimento que não possuiu. E foi numa dessas domingueiras que eu protagonizei um dos momentos de maior constrangimento da minha curta existência.
Estava então eu, trajando meu jeans acima do umbigo, camisa por dentro e um cinto - de verniz para combinar com o sapato - segurando isso tudo, quando as caixas de som gritaram algo como "Atenção! Viiiiiiiiiiideo Cliiiiiip". E do telão surgiu um grupo de cabeludos branquelos tocando a música que seria o hit daquele ano todo. Um pop tão grudento, mas tão grudento, que era possível sentir a viscosidade no ar. Era 1997 e os irmãos Hanson colocavam nas paradas "Mmmmmbop", sua única música de sucesso (uma prova da existência divina, não?). Do chão, braços cruzados, eu e alguns amigos conjecturávamos.
- São três caras? - levantou a bola o primeiro.
- Não, acho que são dois caras e uma menina. Tá na cara que o vocalista é uma garota - opinou um terceiro.
- E o que você conhece de garotas? - provocou o primeiro, emendando uma risadinha
- Mais do que você. Ou tá esquecendo daquela vez que dormi na sua casa e sua irmã... - retrucou de pronto o atacado, já se preparando para retaliação do outro, possivelmente física. Vendo que aquilo não teria fim, interrompi.
- Eu dava uns pegas na garota da guitarra - disse, sem pensar duas vezes.
- Ah, tá bom, você também é ridículo - falou um terceiro camarada.
- É sério, ela é bem gatinha. E pô, toca guitarra - insisti.
Coisa de uma semana depois, estava com os amigos de bobeira quando chega a namorada de um deles com uma Capricho na mão. Ela fica um pouco a parte do grupo e começa a ler. Não mais do que de repente, alguém do grupo grita: "Eles são homens!". Todos se viram para o sujeito, que grita novamente. "Os Hanson, pô! São três irmãos, e são homens. Olha aqui", diz, abrindo a revista e mostrando uma reportagem com o trio.
Antes que alguém fizesse qualquer ligação com o episódio da domingueira, comecei a procurar o meio mais rápido de sair dali. Mas não deu tempo. A garota que trouxe a revista manda um "ué? E alguém achava que eles eram meninas?". Foi pouco para o bando todo se virar para o branquinho aqui e espezinhar até a alma durante meses. Dalí em diante, toda vez que tocava uma música da banda alguém sempre levantava o história. "Ah, o Gustavo já quis dar uns ´catas´ nos Hanson", gargalhavam alucinadamente, "os filhos sairiam quase transparentes de tão brancos", e mais risos histéricos. Eu, claro, rezava para que o avião do grupo caísse no meio do Oceano Atlântico e nunca mais fosse encontrado.
Infelizmente, certas maldições do pop são eternas. Ainda hoje, 10 anos depois daquele infame comentário, é inevitável, durante encontros com os velhos companheiros, alguém lembrar do episódio. As risadas não são mais tão estridentes, mas ainda assim fica a lição. Em tempos de rapazes com sombras nos olhos e garotas de coturno, mantenho a boca fechada e os olhos bem abertos.
4 comentários:
poderia ter sido pior. imagina se tu tivesse tido um amor platônico pela 'guria' hanson e colado um pôster na parede antes de descubrir a verdade.
Olha cara, se eu não tivesse descoberto logo, não sei, não... :)
Tu quis pegar logo o pior? Tsk... =)
Ae Gustavo, nao me lembro exatamente desse episodio, mas lembro das primeiras idas ao RB ...
Pra falar a verdade foi uma epoca que me deixa saudades !
Abracao
Gustavo Tognetta
Postar um comentário